sábado, 27 de junho de 2009

Menina, levante-se! (XIII DTC)

Jesus pegou a menina pela mão e disse: "Talita cúmi", que quer dizer: "Menina, - eu lhe digo - levante-se!" (Mc 5, 41)

No Evangelho de hoje duas estórias foram custuradas juntas (Mc 5, 21-43). São estórias de duas mulheres. A primeira sofria de hemorragia há doze anos. A segunda, uma menina de doze anos, está à beira da morte. Outra coisa comum às duas personagens é o fato de que elas não têm nome. A primeira mulher se mostra ativa e corajosa e toca no manto de Jesus. A outra é recepiente da ação de Jesus que, tocando-a, a levanta do sono da morte. Uma lança luz sobre o destino da outra.

No tempo de Jesus as mulheres eram excluídas da vida social e religiosa pelo simples fato de ser mulheres. O fluxo menstrual trazia à vida de uma garota uma séries de restrições e proibições. Ainda mais excluída era uma mulher doente, proibida de tocar em qualquer pessoa (cf. Lv 15, 25-30). Ela era considerada impura. Doenças eram vistas como castigo de Deus. Portanto, a mulher que sofria de hemorragia era considerada impura e era assim banida da vida social e religiosa. A lei religiosa estabelecia uma rígida linha de divisão entre aqueles/as considerados/as saudáveis e puros/as e os/as que eram considerados/as doentes e impuros/as. Uma linha que dividia e excluía.

Esta mulher, no entanto, ouvindo falar de Jesus e movida pela fé nele, foi no meio da multidão, aproximou-se de Jesus por trás e tocou na roupa dele. A hemorragia parou imediatamente. Agindo assim, ela mostra coragem e ousadia, pois quebra a barreira da exclusão e isolamento. Seu gesto é contrário a lei que colocava limites entre o puro e o impuro. Quanto Jesus pede pela pessoa que o tocou, ela se apresenta a ele tremendo e, consciente de seu ato transgressor da lei sobre as impurezas, conta a ele toda a verdade. No que Jesus responde, "Minha filha, sua fé curou você. Vá em paz e fique curada dessa doença."

Na outra estória, é Jesus mesmo que quebra a barreira da exclusão e divisão. A menina que aos dozes anos está entrando para vida adulta entra no campo da exclusão pelo simples fato de ser mulher. Num certo sentido, aos doze anos ela começa a morrer. Ao tocar no corpo da menina morta, Jesus transgride a lei que proibia qualquer pessoa de tocar no corpo de uma pessoa morta. Do contrário, a pessoa se tornava impura. O Evangelho afirma que Jesus "pegou a menina pela mão e disse: 'Talita cúmi', menina levante-se!" Assim, o Evangelho de Marcos apresenta Jesus como superior a lei. Jesus é o Evangelho – a Boa-Notícia – de Deus que se revela a humanidade. Ele rompe as barreiras de divisão e restaura a vida humana. No caso de hoje, Jesus restabelece a vida e a dignidade destas duas mulheres. É bom lembrar que o verbo ἔγειρε no imperativo, traduzido como "levante-se," carrega o sentido de ressurreição. É o mesmo verbo usado muitas vezes para se referir a ressurreição de Jesus (cf. Gl 1, 1).


Para refletir/comentar:

1. Quais são as leis e os costumes que precisamos superar e vencer? 2. Qual é a Boa-Notícia que o Evangelho de hoje traz para as mulheres e para todas as pessoas segregadas e excluídas?


Senhor Jesus Cristo,
amigo das pessoas excluídas e marginalizadas,
dai-nos a fé e a coragem da mulher que sofria de hemorragia
e nos faz avançar em direção à liberdade e à vida digna.
Ensinai-nos a pegar nas mãos de todas as pessoas que encontramos
e transmitir à elas vossa força, ressurreição e vida.
Amém.




domingo, 21 de junho de 2009

Acalme-se (XII DTC)

Então Jesus se levantou e ameaçou o vento e disse ao mar: "Cale-se! Acalme-se!" (Mc 4, 39)

O trecho do Evangelho deste domingo (Mc 4, 35-41) faz parte de uma seção maior onde Jesus revela seu poder sobre a natureza, a possessão demoníaca (5, 1-20), a doença (5, 25-34) e a morte (5, 21 – 24, 35-43). A questão sobre a identidade de Jesus, fundamental no Evangelho de Marcos, aparece na expressão que encerra a passagem, quando os discípulos indagam, “Quem é esse homem, a quem até o vento e o mar obedecem?”

“... No simbolismo da Bíblia, o mar, embora sujeito ao domínio de Deus, permanece um mundo cheio de mistérios e perigos, em virtude da profundidade de seus abismos, da amargura de suas águas, do perpétuo flutuar de suas ondas, de sua força destruidora quando se desencadeia. Por isso, torna-se também a mais eloqüente e eficaz imagem das forças do mal, orgulhosas e ameaçadoras, que encontram um plástico simbolismo nos míticos e fabulosos monstros que a fantasia popular coloca em seus abismos.” (Missal Dominical – Missal da Assembléia Cristã, Paulus, 1995, p. 939)

Ao controlar as forças da natureza, Jesus faz o mesmo que Deus faz quando derrota as forças que ameaçam a vida (cf. Sl 107, 23-32). A ordem de Jesus ao vento e ao mar, “Cale-se! Acalme-se!”, faz lembrar uma ordem semelhante dada por Jesus ao um espírito mau quando libertou um homem possuído por forças demoníacas (cf. 1, 25). O mar não só representa a instabilidade, o desconhecido e o caos, mas também as forças do mal que atentam contra a vida humana. Sobre elas, Jesus demonstra seu poder.

Ao questionar os discípulos dizendo, “Por que vocês são tão medrosos? Vocês ainda não têm fé?”, Jesus faz a mais dura desaprovação aos díscipulos até o momento no Evangelho de Marcos. Não fica claro se o questionamento se refere a falta de fé nele ou em Deus. Se há falta de fé em Deus, os discípulos deveriam demostrar confiança em Deus, assim como Jesus demonstra (cf. 4, 38). Se há falta de fé em Jesus, os discípulos já deveriam confiar nele e não cair no desespero.

O mundo moderno em que vivemos é caracterizado pelo desenvolvimento científico e tecnológico que busca controlar as forças da natureza. No entanto, hoje, o mal que atenta contra a vida humana parece não estar no campo da natureza, mas nas ações egoísticas e gananciosas do ser humano, cujo apetite incontrolável de alguns coloca em risco a vida de tantos outros e o próprio mundo. Diante das ameaças de morte geradas pela ambição humana, o Evangelho de hoje nos consola e sustenta, afirmando que o poder de Deus em Jesus Cristo é vencedor de todas as forças do mal.


Para refletir/comentar:
1. Quais são as forças do mal que ameaçam a vida humana e sua comunidade em particular? 2. Como podemos superá-las? 3. “Quem é esse homem, a quem até o vento e o mar obedecem?”

Senhor Jesus Cristo,
a quem até o vento e o mar obedecem,
daí-nos a serenidade e a confiança necessárias
para enfrentar os perigos e mal que atentam contra a beleza da vida.
Amém.




domingo, 14 de junho de 2009

O Reino (XI DTC)

O Reino de Deus é como um homem que espalha a semente na terra. (Mc 4, 26)

Neste domingo, retomamos a leitura do Evangelho de Marcos, dando assim continuidade ao Tempo Comum. A espiritualidade deste tempo é a espiritualidade do cotidiano e rotineiro. Ao invés de focar os grandes eventos da salvação, o Tempo Comum nos convida a prestar atenção aos fatos comuns do dia-a-dia e descobrir neles as sementes ocultas do Reino. Durante este tempo, as leituras do Evangelho proclamam as ações e os ensinamentos de Jesus.

Depois da parábola do Semeador, Jesus conta duas parábolas onde o Reino de Deus é comparado a semeadura e a semente (Mc 4, 26-34). Jesus questiona, "Com que coisa podemos comparar o Reino de Deus? Que parábola podemos usar?" E responde, "O Reino de Deus é como um homem que espalha a semente na terra", e ainda, "O Reino é como uma semente de mostarda." Notem, que Jesus compara (é como), mas não dá definições sobre o Reino. Ele usa metáforas para falar sobre o Reino, pois Reino não pode ser definido ou contido em formas racionais rígidas. O Reino é uma realidade dinâmica – é como um homem que espalha a semente -, e misteriosa, sobre a qual o homem não tem controle – a semente vai brotando e crescendo, mas o homem não sabe como isso acontence. O Reino é ainda uma realidade surpreendente, universal e irreversível, que atinge seu fim de qualquer maneira, "... a mostarda, que é a menor de todas as sementes da terra (...) quando é semeada, a mostarda cresce e torna-se maior que todas as plantas; ela dá ramos grandes, de modo que os pássaros do céu podem fazer ninhos em sua sombra." Valendo-se de imagens comuns aos seus ouvintes da Galiléia, Jesus deseja despertar a imaginação criativa das pessoas. O Reino faz parte do mundo da imaginação, da utopia, do sonho. Isto não significa que ele não exista ou esteja distante, inacessível. Na verdade, ele é a força vital atrás da realidade que percebemos. O Reino tem haver com as aspirações mais profundas do ser humano, que são também aspirações de Deus.

Hoje, muitos sofrem de incapacidade poética, têm dificuldades de atiçar a imaginação criativa e não conseguem sonhar o sonho do Reino. Na sociedade capitalista nossos sonhos foram transformados em sonhos de consumo: produtos e serviços que prometem o que jamais podem realizar. "Sonhamos" os produtos que o mercado deseja que sonhamos. Parece que a propaganda nos roubou a capacidade de sonhar sonhos mais ousados. A mídia, atravé do marketing, domestica e controla nossa capacidade criativa e bloqueia imaginações mais ousadas. Assim, hoje, as parábolas do Reino provocam a nossa imaginação, a nosso poder de criar, inventar e re-inventar o novo. Para a pessoa de fé, o Reino não se rende. Ele está aí. Ele nos energiza, e nos dá capacidade de mover montanhas. O Reino é difícil de explicar racionalmente, mas é real. Ele é como...


Para refletir e comentar:

  1. Use sua imaginação poética e responda, "Com que coisa podemos comparar o Reino de Deus?" O Reino de Deus é como...


Senhor Jesus Cristo,
Semeador das sementes do Reino,
não permitas que nossa imaginação seja atrofiada.
Dai-nos capacidade de sonhar o sonho do Reino,
dinâmico, surpreedente e universal,
difícil de se expressar em conceitos rígidos,
mas tão real e necessário quanto o "pão nosso de cada dia."
Amém.


quinta-feira, 11 de junho de 2009

Corpus Christi

Enquanto comiam, Jesus tomou um pão e, tendo pronunciado a bênção, o partiu, distribuiu a eles, e disse: "Tomem, isto é o meu corpo." (Mc 15, 22)

"O Cristianismo é, por excelência, a religião da unidade e da inclusão dos corpos. Em sua natureza semítica não há lugar para o dualismo platônico, que faz do corpo cárcere do espírito e, deste, o retrato em negativo da concupiscência da carne. No batismo, nosso corpo é lavado no sangue de Cristo. Na eucaristia, ele se nutre do corpo de Deus. No matrimônio, "numa só carne" os corpos se fundem no amor que transubstancia o carinho em liturgia e a sexualidade em fonte prazerosa de vida. No Credo, os cristãos professam a fé "na ressurreição da carne".

Assim, a fé cristã sacraliza a corporalidade humana, templo vivo de Deus, e repudia tudo aquilo que aprofana: opressão, exclusão, humilhação, violência, fome etc. Pois, em Jesus, Deus assume o corpo humano. "O Verbo fez-se carne", proclama o evangelho de João. A prática de Jesus caracterizou-se pelo resgate do corpo: se doente, é curado; se oprimido, libertado; se condenado, perdoado; se excluído, acolhido. E sempre amado.

Jesus deixou que tocassem seu corpo, a ponto de uma prostituta lavar-lhe os pés e enxugá-los com os cabelos, beijá-los e ungi-los com perfume (Lucas 7, 36-50). E fez de dois recursos indispensáveis à sobrevivência do corpo - a comida e a bebida, pão e vinho - sacramento, no qual o seu corpo eucarístico nos é dado como alimento para a vida eterna, desde que, agora, saibamos, no amor, testemunhar que a vida é terna.

Fazer silêncio dentro de si, deixar fluir a voz interior e tratar o semelhante como sacramento vivo, são cuidados do corpo. Abrir-se ao Deus que nos habita pela graça, pela fé e por essa fascinante história da evolução do Universo que, desde o Big Bang, culmina nesse fruto inefável da natureza que é cada um de nós. O corpo de Gaia também é corpo de Cristo. A Igreja deveria incluir entre os pecados a devastação de florestas, a poluição do ar e dos rios, a contaminação dos mares. Deveria clamar mais alto, não apenas em prol das espécies animais ameaçadas de extinção, mas sobretudo em favor da espécie mais degradada pela fome e pela violência: a humana.

Gente é para brilhar, canta o poeta. Se em nossa sociedade os corpos não brilham ou brilham só quando besuntados de cosméticos, e não banhados de luz interior, algo anda errado. A festa anual de Corpus Christi quer nos fazer recordar que corpo é copo, cálice, onde se bebe o vinho da alegria e da salvação, inserido no corpo místico e cósmico do Cristo.

Só haverá futuro digno quando todos os corpos viverem em comunhão, saciados da fome de pão e de beleza."
(Frei Betto)

Para refletir e comentar:
1. Qual é a mensagem fundamental de Corpus Christi?


Na verdade, vós sois santo e digno de louvor, ó Deus,
que amais os seres humanos e sempre os assistis no caminho da vida.
Na verdade, é bendito o vosso Filho, presente no meio de nós,
quando nos reunimos por seu amor.
Como outrora aos discípulos,
ele nos revela as Escrituras e parte o pão para nós.
- O vosso Filho permaneça entre nós!

(trecho da Oração Eucarística VI – D)

domingo, 7 de junho de 2009

Santíssima Trindade

... Vão e façam com que todos os povos se tornem meus discípulos, batizando-os em nome do Pai, e do Filho, e do Espírito Santo. (Mt 28, 19)

No domingo da Solenidade da Santíssima Trindade, nós refletimos a passagem que conclui o Evangelho de Mateus (Mt 28, 16-20). Seguindo a ordem de Jesus para retornarem a Galiléia, os onze apóstolos vêem Jesus Ressuscitado e o adoram. A montanha onde eles se encontram é um lugar simbólico, que remete ao Sinai e ao lugar onde Jesus proferiu o famoso sermão no evangelho de Mateus (cf. Mt, 5-7). O fato do evangelho afirmar que alguns duvidaram parece atestar que fé e dúvida sempre fizeram parte da caminhada da Igreja. Depois, Jesus se aproxima deles e diz, "Toda autoridade foi dada a mim no céu e sobre a terra. Portanto, vão e façam com que todos os povos se tornem meus discípulos..." Jesus ressuscitado, Senhor da história, recebe toda a autoridade do Pai e confere ao onze a missão de fazer com que todos os povos se tornem seus discípulos. Em seguida, ele explica como isso dever ser feito: "...batizando-os em nome do Pai, e do Filho, e do Espírito Santo", e "...ensinado-os a observar tudo o que ordenei a vocês." Pelo batismo, nos tornamos participantes da vida divina e co-responsáveis pela missão de Jesus Cristo. A tarefa de ensinar o quê Jesus ordenou, nos faz voltar aos ensinamentos contido no evangelho, sobretudo ao Sermão da Montanha, onde as Bem-Aventuranças têm lugar central.

Os onze representam o primeiro núcleo da comunidade cristã. A missão de fazer discípulos que Jesus confere a eles é para todos nós. Ela é um chamado universal. Na Igreja, o ofício de ensinar é sempre urgente e requer o envolvimentos de todos. O ministério da Palavra, em toda sua diversidade, busca responder a este chamado. As palavras finais de Jesus no evangelho de Mateus nos conforta e anima, "Eis que eu estarei com vocês todos os dias, até o fim do mundo."

Para refletir e comentar: 1. O batismo no faz participantes da vida divina e da missão de Jesus Cristo. Como minha comunidade responde ao mandado de Jesus, "Vão e façam com que todos os povos se tornem meus discípulos..."?


Bendito sejas vós Senhor Jesus, Emanuel, Deus-conosco,
por sempre nos acompanhar nos caminhos da história.
Vossa presença nos anima a seguir evangelizando segundo o vosso mandado,
e nos impulsiona a viver o dia-a-dia no espírito de vossas bem-aventuranças.
Por tudo isso, damos graças ao Pai,
em Cristo, nosso Senhor,
na unidade do Espírito Santo.
Amém.